Estupenda


Nós a aguardávamos em uma ampla sala de reuniões, absolutamente desprovida de personalidade. Eu e minha chefe nos olhávamos com certa ansiedade e angústia. A mulher que esperávamos poderia ser a solução para muitos dos problemas que enfrentávamos no Recursos Humanos. Ela era uma psicóloga organizacional com um currículo bastante interessante e referências positivas. Porém, não a conhecíamos ainda.

Estávamos tão aflitas para jogarmos em cima de alguém aquele monte de problemas de RH difíceis de resolver, que nossos olhinhos saltavam de felicidade com a perspectiva de ser ELA a solução para tudo. Sentadas de frente uma para outra, olhos vidrados uma na outra, mãos cruzadas e braços apoiados sobre a mesa, corpos inclinado em direção uma à outra, um sorriso imenso querendo alargar-se ainda mais, éramos uma algazarra silenciosa à espera da candidata. 

A secretária anuncia sua chegada. Respiramos fundo, arrumamos os cabelos, a postura, esfregamos as mãos uma na outra, nos benzemos com todas as energias positivas possíveis e, enfim, dissemos: faça entrar!
Levantamo-nos para recebê-la, tentando diminuir aquele sorriso imenso. Mas quando ela entrou, Santo Pai! Que mulher era aquela? Perdoem-me, vou me corrigir: que MULHERÃO era aquele?

Entra na sala uma morena de cabelos encaracolados, harmoniosamente desgrenhados, caindo pelos ombros provocadoramente, sobre um vestido verde floresta que emoldurava um corpo esguio feito Naja do deserto no sol mais quente do ano. Uns olhos, igualmente, de Naja pronta para o encantamento. A pele morena parecia de fruta e cheirava a fruta. A figura dela, por si só, era estupenda.

Eu e minha chefe, disfarçadamente, nos entreolhamos, sentamo-nos e convidamos nossa entrevistada para sentar-se e apresentamos a ela o pior cenário possível. Impassível, ela ouviu tudo sem mover um cílio tal qual uma máscara do carnaval veneziano. Findo o nosso tratado, ela cruzou as pernas, respirou profundamente, e com aquela pose típica dos psicólogos, pôs-se a tratar-nos e aos nossos problemas desfiando mil teorias que pouco nos interessavam.

Já estávamos desanimadas. O lindo vestido verde da moça, aqueles cachos tão atraentes, o olhar tão penetrante, agora, tudo me parecia desbotado. Nem o sotaque gostosamente baiano me causavam mais qualquer impacto positivo.

Estávamos sonolentas, desanimadas, pensando naquela montanha de problemas que necessitava urgentemente da interferência de uma psicóloga organizacional enérgica e pronta para meter a mão na massa e fazer daquilo tudo algo novo e produtivo. Àquela altura, queríamos apenas que ela parasse de falar e fosse embora. Talvez, minha chefe ainda guardasse alguma esperança. Mas eu, já estava pensando na minha mesa cheia de trabalho a fazer e eu sozinha para encará-lo.

De repente, não mais que de repente, o mulherão descruza as pernas, espalma as duas mãos sobre a mesa, nos encara e diz: o desafio é grande, mas eu tenho a disposição e a capacidade de enfrentá-lo. Só preciso de uma coisa de vocês: comprometimento.

Naquele momento, senti todos os fios daquela estupenda mulher conectando-se a tudo que havia naquela sala e nos conectando a algo inovador.

Era ela. Estava contratada. Eis que a baianinha voltou a brilhar.

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