Amores

Nat King Cole cantou em When I fall in love, o que nossos corações vislumbram quando o amor surge na alvorada da vida:

“When I fall in love / it will be forever / or I’ll never fall in love … / When I give my heart / it will be completely / or I’ll never give my heart.”

[Quando eu me apaixonar / será para sempre / ou então eu nunca me apaixonarei…/ Quando eu entregar o meu coração / será completamente / ou eu nunca o entregarei.]

Como suave melodia, tal qual Claire de Lune, de Claude Debussy, ouvimos o PRIMEIRO AMOR. Passeamos por suas notas: são tão delicadas! Os instrumentos surgindo um a um e se complementando, ganhando corpo, nos mostrando as contradições entre as emoções, percebidas apenas suavemente. Em um tom mais agudo: a dor, a agonia e a angústia – o que seria?

O alívio, então, chega e, de repente, explode em sutil alegria. Ah! É o PRIMEIRO AMOR! Os primeiros olhares que se encontram, apaixonados. As mãos que pela primeira vez se tocam, trêmulas. A respiração compartilhada quando, finalmente, os lábios se aproximam. Doce, suave e elegante é a primeira melodia do coração, aquela que crê que “quando eu me apaixonar será para sempre... quando eu entregar o meu coração, será completamente”.

A canção do PRIMEIRO AMOR se inicia e se encerra e continua, nesta nossa busca incessante, ressurgindo no tema do AMOR ETERNO.

Andy Willliams nos conta em Were do I begin que:

“She fills my soul with so much love / That anywhere I go I’m never lonely”

[Ela preenche minha alma com tanto amor / Que para todo lado que eu vou, eu nunca estou sozinho].

Trata-se da comunhão completa de duas almas, cantada, também, por Vinícius de Moraes, no Soneto do amor total:

“Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.
(...)
E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.”


Williams e Moraes acreditam, no entanto, que, mesmo sendo pleno, o AMOR ETERNO é efêmero. Williams canta:

“How long does I last / Can lobe be measured by the hours in a day / I have no answers now but this much I can say / I know I’ll need her till the stars all burn away / And she’ll be there.”

[Quanto tempo dura? / Pode um amor ser medido pelas horas do dia? / Eu não tenho nenhuma resposta agora, mas isto eu posso dizer / Eu sei que precisarei dela até que as estrelas se apaguem / E ela estará lá.”

Nos versos de Vinícius, nosso poetinha:
“Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito, enquanto dure.”


É o próprio poetinha quem nos prepara para aquele momentinho da vida pelo qual todos nós passamos um dia: a separação. O Soneto de separação é tão belo quanto o Soneto da fidelidade, pois tratam, no fundo, da mesma matéria. Diz o poeta:

“De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo, o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.”


Há, ainda, o GRANDE AMOR. Talvez, no entardecer da vida, quando muitas chamas já se apagaram e o infinito já não é mais um conceito tão exato, sonhamos com o GRANDE AMOR. É quando dizemos, junto com Florbela Espanca:

“Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida.
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão do meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida!
(...)
E, olhos postos em ti, digo de rastros:
Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!”


A poetisa, contudo, sabiamente, nos convida a refletir sobre nossa existência, neste entardecer, e nos diz:

“São mortos os que nunca acreditaram
Que esta vida é somente uma passagem,
Um atalho sombrio, uma paisagem
Onde os nossos sentidos pousaram.”


E neste pouso sobre o ideal do GRANDE AMOR, Florbela nos confessa que se esvai, mais uma vez, a ilusão do amor:

“Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!

Os dias são Outonos: choram... choram...
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E ele é, ó meu Amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...”


Enquanto o sol percorria o céu de nossas vidas, do alvorecer ao entardecer, vivemos o amor “adverbialmente”: suavemente, profundamente, completamente, intensamente, ardentemente, sofregamente... até o anoitecer, quando, enfim, ouvimos tocar Somewhere in time.

É, ainda, Florbela Espanca, que ao som daquela canção, nos acompanha nesta releitura da vida:

“Todas as prendas que me deste, um dia,
Guardei-as, meu encanto, quase a medo,
E quando a noite espreita o pôr-do-sol,
Eu vou falar com elas em segredo...”


Buscamos, em algum lugar do passado, o AMOR VERDADEIRO. Terá sido o PRIMEIRO? O ETERNO? O GRANDE AMOR? Nesta nostalgia, é também Florbela quem encontra a melhor resposta...

“Quem nos deu asas para andar de rastos?
Quem nos deu olhos para ver os astros
Sem nos dar braços para os alcançar?!...”

Seria o Amor um ideal inacessível? Ou nós não somos capazes de vivê-lo tal qual o sonhamos? Estamos deixando de ser humanos e desejando viver divinamente o Amor?

É por isso que, hoje, eu termino, simplesmente, com Adele, em One and Only, e a certeza única de que não existe um ÚNICO AMOR:

“I don’t know why I’m scared,/ I’ve been here before,/ Every feeling, every word,/ I’ve imagined it all, / You’ll never know if you never try, / To forgive your past and simply be mine.
(…)
Know it ain’t easy giving up your heart, / I know it ain’t easy giving up your heart, / Nobody’s perfect. / I know it ain’t easy giving up your heart / Trust me I’ve learned it.
(…)
So I dare you to let me be your, your one and only, / I promise I'm worth it, / To hold in your arms, / So come on and give me a chance, / To prove I am the one who can walk that mile, / Until the end starts.”


[Eu não sei porquê eu estou com medo / Já senti isso antes / Cada sentimento, cada palavra / Já imaginava tudo / Você nunca vai saber se não tentar / Perdoar o passado e simplesmente ser meu /
(...)
Eu sei que não é fácil desistir do seu coração / Eu sei que não é fácil desistir do seu coração / Ninguém é perfeito / Eu sei que não é fácil abrir mão de seu coração / Confie em mim eu aprendi /
(...)
Te desafio deixar-me ser sua, a verdadeira e única / Prometo que sou merecedora do teu abraço / Por isso me dê uma chance! / Para provar que eu sou a única que pode fazer / Essa caminhada / Até o fim começar.]

E, ainda que seja o anoitecer, e que todas as nossas percepções sobre o Amor estejam erradas, “Até o fim começar”, “confie em mim, eu aprendi”, “você nunca vai saber se não tentar.”

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